Boletim Bocater

Marco Regulatório Trabalhista: avanço para a desburocratização

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Em novembro de 2021, o Governo Federal pulicou o Decreto nº 10.854/21, que trata da consolidação do Marco Regulatório Trabalhista e regulamenta importantes normas trabalhistas e questões relacionadas a fiscalização das normas de proteção, saúde e segurança no trabalho.

No interesse dessa leitura, abordamos abaixo os principais temas trazidos pelo Marco Regulatório Trabalhista:

I – Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas Infralegais

II – Prêmio Nacional Trabalhista

III – Livro de Inspeção do Trabalho Eletrônico – eLIT

IV – Fiscalização das normas de proteção ao trabalho e de segurança e saúde no trabalho

V – Diretrizes para elaboração e revisão das normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho

VI – Certificado de aprovação do equipamento de proteção individual, nos termos do disposto no art. 167 da Consolidação das Leis do Trabalho

VII – Registro eletrônico de controle de jornada, nos termos do disposto no art. 74 da Consolidação das Leis do Trabalho

VIII – Mediação de conflitos coletivos de trabalho

IX – Empresas prestadoras de serviços a terceiros

X – Trabalho temporário

XI – Gratificação de Natal

XII – Relações individuais e coletivas de trabalho rural

XIII – Vale-transporte, nos termos do disposto na Lei nº 7.418, de 16 de dezembro de 1985

XIV – Programa Empresa Cidadã, destinado à prorrogação das licenças maternidade e paternidade

XV – Situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior

XVI – Repouso semanal remunerado e pagamento de salário nos feriados

XVII – Relação Anual de Informações Sociais – RAIS

XVIII – Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT

 


 

I

Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas Infralegais

O decreto prevê a instituição de um Programa Permanente, cuja intenção é revisar, compilar e consolidar as normas infralegais trabalhistas para deixá-las mais acessíveis e transparentes.

A revisão da legislação trabalhista consiste no exame do mérito, oportunidade, conveniência e compatibilização da matéria neles tratada com as políticas e as diretrizes do Governo Federal e na revogação de atos normativos exauridos ou tacitamente revogados.

A normas serão organizadas em coletâneas, em ambiente único e digital, constantemente atualizado, de acordo com os seguintes temas:

I – legislação trabalhista, relações de trabalho e políticas públicas de trabalho;

II – segurança e saúde no trabalho;

III – inspeção do trabalho;

IV – procedimentos de multas e recursos de processos administrativos trabalhistas;

V – convenções e recomendações da Organização Internacional do Trabalho (OIT);

VI – profissões regulamentadas; e

VII – normas administrativas.

A compilação será avaliada pelo Ministério do Trabalho e Previdência a cada dois anos, a fim de monitorar os resultados obtidos quanto à aderência aos objetivos específicos do Programa Permanente.

Com isso, o Programa pretende promover a interação entre o Ministério Público do Trabalho (MPT) e os administrados, integrar as políticas e normas trabalhistas e previdenciárias, melhorar o ambiente de negócios e aumentar a competitividade e a eficiência do setor público.

II
Prêmio Nacional Trabalhista

Em relação ao Prêmio Nacional Trabalhista, a medida foi estipulada com objetivo de “estimular a pesquisa nas áreas de direito do trabalho, segurança e saúde no trabalho, economia do trabalho, auditoria-fiscal do trabalho, além de temas correlatos a serem estabelecidos pelo Ministério do Trabalho e Previdência” (Art. 10).

O Prêmio ainda depende de regulamentação, por ato do Ministério do Trabalho e Previdência, na qual deverão contar os critérios de avaliação, as categorias e as ações laureadas.

A coordenação e implementação fica a critério do Ministério e os recursos para execução serão oriundos de parcerias que poderão ser estabelecidas tanto com as entidades públicas quanto com as privadas.

III
Livro de Inspeção do Trabalho Eletrônico – eLIT

Outra novidade trazida é o Livro de Inspeção do Trabalho Eletrônico (eLIT), novo instrumento oficial de comunicação entre a empresa e a inspeção do trabalho, em substituição ao Livro impresso (Art. 11 e ss).

Todas as empresas que admitam empregados celetistas ficam abrangidas pelo eLIT, inclusive profissionais liberais, as instituições beneficentes, as associações recreativas, outras instituições sem fins lucrativos, microempresas e as empresas de pequeno porte.

Como princípios norteadores do eLIT, estão a simplificação do cumprimento das obrigações trabalhistas, a eliminação de formalidades e exigências desnecessárias, a padronização de procedimentos e a transparência.

Com a implementação do eLIT, será possível estabelecer uma comunicação célere e eficiente entre empresas e o órgão fiscalizador trabalhista, na medida em que as empresas possuirão ferramentas eletrônicas gratuitas e interativas de avaliação de riscos em matéria de segurança e saúde no trabalho, que simplificarão os procedimentos de pagamento de multas administrativas e obrigações trabalhistas, possibilitarão o envio de documentação eletrônica exigida em razão da instauração de procedimento administrativo ou de medida de fiscalização, registrarão os atos de fiscalização e o lançamento de seus resultados, cientificarão a empresa quanto à prática de atos administrativos, medidas de fiscalização e avisos em geral, dentre outros recursos digitais.

IV
Fiscalização das normas de proteção ao trabalho e de segurança e saúde no trabalho

O Decreto também apresenta preocupação com as normas de proteção ao trabalho e de segurança e saúde no trabalho, definindo a competência exclusiva aos Auditores-Fiscais do Trabalho do Ministério do Trabalho e Previdência para fiscalização de tais normas (Art. 16).

As denúncias sobre irregularidades e os pedidos de fiscalização trabalhista passarão a ser realizadas por canais eletrônicos, utilizados por trabalhadores, órgãos e entidades públicas, entidades sindicais, entidades privadas e outros interessados, e serão endereçadas para Subsecretaria de Inspeção de Trabalho da Secretaria de Trabalho do Ministério.

A confidencialidade dos documentos e informações depositados no sistema, assim como a identidade dos usuários dos canais eletrônicos é garantida pelo Decreto.

Na impossibilidade de uso ou acesso aos canais eletrônicos, poderão ser admitidos outros meios para recebimento de denúncias sobre irregularidades trabalhistas.

V
Diretrizes para elaboração e revisão das normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho

Para além da fiscalização, o Decreto traz diretrizes para elaboração e revisão das normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho.

Isso incluirá mecanismos de consulta à sociedade em geral e às organizações sindicais mais representativas de trabalhadores e empregadores.

De acordo com o Decreto, a norma regulamentadora deve visar a redução dos riscos inerentes ao trabalho, a dignidade da pessoa humana, o embasamento técnico ou científico, a harmonização das normas, a transparência no exercício da competência normativa, a simplificação e a desburocratização do conteúdo das normas regulamentadoras e a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas.

 

VI
Certificado de aprovação do equipamento de proteção individual, nos termos do disposto no art. 167 da Consolidação das Leis do Trabalho

Seguindo a linha de cuidados com as normas de segurança e saúde no trabalho, o Decreto define os critérios para comercialização de equipamentos de proteção individual (EPI), sendo essencial a obtenção do certificado de aprovação, emitido pela Secretaria de Trabalho do Ministério do Trabalho e Previdência, por meio de sistema eletrônico simplificado.

VII
Registro eletrônico de controle de jornada, nos termos do disposto no art. 74 da Consolidação das Leis do Trabalho

Em se tratando do controle de jornada, o registro será eletrônico, na forma determinada pelo Ministro do Trabalho e Previdência.

O sistema será desenvolvido de modo a coibir fraudes e permitir o desenvolvimento de soluções inovadoras, além de garantir a concorrência entre os ofertantes.

O ponto eletrônico registrará fielmente as marcações efetuadas, mas permitirá a pré-assinalação de períodos de repouso e de ponto por exceção à jornada regular de trabalho.

VIII
Mediação de conflitos coletivos de trabalho

Em relação à mediação de conflitos coletivos de trabalho, objetivando a redução da judicialização trabalhista, o Decreto dispõe sobre a possibilidade de solicitação à Secretaria de Trabalho do Ministério do Trabalho e Previdência da realização de mediação, com vistas à composição de conflito coletivo.

A solicitação poderá ser feita por trabalhadores, por intermédio de entidades sindicais representantes, e por empregadores, por si próprios ou por intermédio de entidades sindicais representantes.

A medição será sem ônus para as partes e recairá sobre servidor público em exercício no Ministério do Trabalho e Previdência, inclusive os Auditores-Fiscais do Trabalho.

Na hipótese de haver consenso entre as partes, o mediador deverá lavrar a ata com natureza de título executivo extrajudicial.

Os procedimentos e ferramentas das mediações eletrônicas ou digitais serão editados por ato do Ministério do Trabalho e Previdência.

IX
Empresas prestadoras de serviços a terceiros

Ademais, no que toca a terceirização de trabalho e seus efeitos, o Decreto tratou de esclarecer que não se configura vínculo empregatício a relação entre os trabalhadores ou sócios das empresas prestadoras de serviços, independentemente do ramo de suas atividades, e a empresa contratante.

Nesse sentido, a verificação do vínculo empregatício e eventuais infrações trabalhistas deverá ser apurada em relação a empresa prestadora dos serviços e não em relação à empresa contratante, exceto nas hipóteses de fraude na contratação da prestadora.

A CLT já previa que a empresa prestadora de serviços contrata, remunera e dirige o trabalho realizado pelos terceirizados, mas a novidade trazida pelo Decreto é a possiblidade de subcontratação de outras empresas para realização desses serviços.

A empresa contratante continua sendo subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços. Por outro aspecto, a empresa contratante será responsável pelas infrações relacionadas às condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores.

Sobre grupo econômico, o Decreto determinada que é vedada a sua caracterização pela mera identidade de sócios, sendo necessário atentar a existência de interesse integrado, de efetiva comunhão de interesses e de atuação conjunta das empresas que o integrem.

X
Trabalho temporário

Em relação ao tema, o Decreto tratou de compilar o complexo normativo que abordava a matéria.

Nesse contexto, nos termos do art. 41, considera-se trabalho temporário “aquele prestado por pessoa natural contratada por empresa de trabalho temporário que a coloca à disposição de empresa tomadora de serviços ou cliente para atender à necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços”.

O Decreto ratifica direitos trabalhistas previstos em legislações dispersas, de forma que a empresa de trabalho temporário permanece com a obrigação de registrar o trabalhador temporário, nas anotações gerais da Carteira de Trabalho e Previdência Social, o que também poderá ser realizado por meio eletrônico.

As contribuições previdenciárias e os demais documentos comprobatórios do cumprimento das obrigações trabalhistas devem ser apresentados em eventual fiscalização trabalhista.

Apesar de assegurar todos os direitos trabalhistas e garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, não existe vínculo empregatício, independentemente do ramo da empresa tomadora de serviços ou cliente, entre esta e os trabalhadores contratados pelas empresas de trabalho temporário.

Cabe ressalvar que o trabalhador temporário não poderá ter contrato superior a 180 dias corridos, apenas podendo assinar novo contrato temporário após 90 dias do fim do vínculo anterior.

XI
Gratificação de Natal

A gratificação de Natal será paga pelo empregador até o dia 20 de dezembro de cada ano, corresponderá a um doze avos da remuneração devida em dezembro, por mês de serviço, do ano correspondente.

Nos casos em que o empregado auferir renda variável, nos termos do art. 77, a gratificação “será calculada na base de um onze avos da soma dos valores variáveis devidos nos meses trabalhados até novembro de cada ano e será adicionada àquela que corresponder à parte do salário contratual fixo, quando houver”.

O adiantamento da gratificação de Natal será pago entre os meses de fevereiro e novembro de cada ano, em parcela única, no valor de metade do salário recebido pelo empregado no mês anterior ao do pagamento, mas o empregador não fica obrigado a pagar o adiantamento a todos os seus empregados no mesmo mês.

Somente na hipótese de extinção do contrato por justa causa o empregado não receberá a gratificação – art.82

XII
Relações individuais e coletivas de trabalho rural

O Marco Regulatório Trabalhista buscou compilar as normas que tratavam do tema em destaque, disciplinando “a aplicação das normas reguladoras do trabalho rural, nos termos do disposto na Lei nº 5.889, de 1973” (art. 83), definindo as figuras de empregado e empregador rural e as nuances do contrato de trabalho rural.

XIII
Vale-transporte, nos termos do disposto na Lei nº 7.418, de 16 de dezembro de 1985

O Decreto 10.854/21 esclarece que são beneficiários do vale-transporte os trabalhadores em geral.

Esse benefício é uma antecipação de despesa de deslocamento do trabalhador entre residência e trabalho, não importando o número de trechos ou número de meios de transporte necessários.

De acordo com o Decreto, é vedado ao empregador substituir o vale-transporte por antecipação em dinheiro ou outra forma de pagamento, exceto quando se tratar de empregado doméstico ou quando da indisponibilidade operacional da empresa operadora, ocasião em que o beneficiário será ressarcido pelo empregador.

Para custear o benefício, o trabalhador contribuirá com 6% do valor do seu salário básico e o empregador custeará no que exceder a parcela.

Quanto a contribuição do empregador, o benefício não tem natureza salarial e não constitui base de cálculo previdenciário ou tributável.

XIV
Programa Empresa Cidadã, destinado à prorrogação das licenças maternidade e paternidade

Como meta de fomento à qualidade de vida dos trabalhadores, o Estado instituiu o Programa Empresa Cidadã.

O programa confere benefícios fiscais a empresas que oferecem aos funcionários o prolongamento, por 60 dias, da duração da licença-maternidade e por quinze dias, da licença-paternidade.

Em ambos os casos, os funcionários gozarão de remuneração integral (art. 141) durante todo período.

XV
Situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior

O Decreto regulamenta a situação de trabalhadores transferidos ou contratados para prestar serviços no exterior e dispõe sobre o procedimento de remessa da remuneração paga em moeda nacional para o local de trabalho no exterior.

 

Cabe a ressalva de que a contratação de trabalhador brasileiro por empresa estrangeira para trabalhar no exterior fica condicionada à autorização do Ministério do Trabalho e Previdência, devendo a empresa contratante preencher uma série de requisitos relacionados à sua existência jurídica, além da comprovação de sociedade com pessoa jurídica domiciliada no Brasil (mínimo 5% do capital social).

XVI
Repouso semanal remunerado e pagamento de salário nos feriados

Buscando esclarecer quaisquer questões relativas à remuneração em feriados e repouso semanal, o Marco Regulatório dispôs um capítulo próprio sobre o tema.

Como se sabe, o descanso semanal remunerado deve ser de 24 horas consecutivas, preferencialmente aos domingos.

Para os estabelecimentos que funcionam aos domingos, será estabelecida uma escala mensal de revezamento e o empregado receberá pagamento em dobro, exceto se a empresa determinar outro dia de folga (folga compensatória).

O texto traz ainda uma modificação, reduzindo de 7 para 4 o limite de feriados locais declarados por Lei Municipal (art. 153, § único).

Ainda, em caráter excepcional, o Ministro do Trabalho e Previdência poderá autorizar o trabalho em data de repouso semanal ou feriado, desde que cumpridas as exigências técnicas e garantida a remuneração correspondente. (art. 154 e ss)

A propósito, a Lei 10.101/00 (que trata dos comerciários), define que o descanso semanal deve coincidir com os domingos pelo menos uma vez no período máximo de três semanas. Por analogia, a Justiça do Trabalho costuma aplicar essa regra para os demais setores.

XVII
Relação Anual de Informações Sociais – RAIS

A Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) busca suprir a necessidade de controle do Estado, servindo de banco de dados para definição de pagamento do abono salarial, nos termos do disposto na Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990.

As informações que integraram a RAIS serão prestadas por pessoas físicas, que tenham mantido empregados contratados, com exceção de empregado doméstico, ou pessoas jurídicas, inscritas no CNPJ da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia.

A RAIS conterá as informações solicitadas pelo Ministério do Trabalho e Previdência, sobre PIS/PASEP, nacionalização do trabalho, FGTS, além da coleta de dados para subsidiar estudos técnicos, de natureza estatística.

XVIII
Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT

Visando a melhor qualidade de vida e nutricional dos trabalhadores, o Marco Regulatório buscou regulamentar o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), que consiste na opção da empresa em manter serviço próprio de refeições, distribuir alimentos ou firmar contrato com entidades de alimentação coletiva.

Para usufruir dos benefícios fiscais relacionados ao PAT, a pessoa jurídica deverá fazer sua inscrição junto ao Ministério do Trabalho e Previdência.

A gestão do PAT será compartilhada entre o Ministério do Trabalho e Previdência, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e o Ministério da Saúde.

Um ponto que merece destaque é a busca por atender prioritariamente os trabalhadores de baixa renda, podendo o programa se estender aos demais trabalhadores, caso haja o interesse mútuo, conforme disposto no art. 171 do Marco Regulatório Trabalhista.

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